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Sul de Minas
SUL DE MINAS

O Sul de Minas na história das Gerais

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Formação do Sul de Minas

Antonio de Paiva MOURA

Toponímia
No final do século XVII o caminho velho, de São Paulo em direção ao Norte do Continente, tendo Piratininga e Mojimirim com ponto de partida atingiam Minas Gerais passando por Tabaubaté, Atibaia e Bragança. Foi a expedição de Fernão Dias que deu início ao povoamento da região, especialmente as fazendas de abastecimento e pouso instaladas nas proximidades dos caminhos. Com a descoberta do ouro abriu-se o caminho novo de Parati, passando pelo Campo das Vertentes e atingindo a região central de Minas. Embora tenha diminuído a importância do caminho velho, o novo não anulou o tráfego do Sul de Minas que continuou intenso, como via de abastecimento da região mineradora.
Em 1701, o taubateano Tomé Portes Del Rei, proprietário de uma fazenda às margens do Rio das Mortes, ponto estratégico de acesso às minas de Caeté, Sabará e ouro preto, criou e obteve o direito de passagem pelo rio, com o nome de Porto Real da Passagem. Toma o nome de Ponta do Morro. Com o aparecimento do ouro logo em seguida (1702), o local passou a ser procurado por enorme quantidade de forasteiros. Em dois anos tomava o nome de Arraial Novo. Recém-empossado no governo da capitania de São Paulo e Minas, de passagem pelo Rio das Mortes, Dom Braz Baltazar da Silveira resolveu elevar o Arraial Novo à categoria de Vila, a quarta de Minas, por ato de 8 de dezembro de 1713, com o nome de São João Del Rei. Homenageia nesse nome o rei D. João V e o pioneiro da região. Quatro meses depois a vila era elevada à condição de cabeça de comarca do Rio das mortes. Do início das explorações das jazidas de ouro até o século XIX a região cresceu desordenadamente formando núcleos populacionais próximos. O Arraial Velho depois de emancipado passa a chamar-se São José do Rio das Mortes, em 1860 toma o nome de São José del Rei e hoje Tiradentes, parece ter antecipado ao Porto Real da Passagem na exploração de ouro. Aumentando com rapidez a sua população e a sua produção diversificada Tiradentes desmembrou-se de São João Del Rei em 1718, ultrapassando a sua rival. Durante 71 anos a Comarca do Rio das Mortes só teve dois municípios:
Observa Carrato que depois da Inconfidência Mineira ocorreu uma verdadeira diáspora em Minas em que os povos das regiões auríferas se espalharam em migrações internas para os extremos da Capitania A região Sul era tomada quase inteiramente pela Comarca dos Rio das Mortes. (CARRATO, J. F. 1968; 218) No século XIX, especialmente após a Independência, verifica-se uma substancial mudança na região. O crescimento econômico gerou expansão para outras regiões da Província. Contribuiu também com a mudança da fisionomia da região os constantes desmembramentos com criação de novos distritos, municípios e comarcas. Para o Sul, em direção a São Paulo, as migrações foram mais aceleradas com a criação intensiva e fazendas de policultura. Surgem os municípios de Baependi e Jacui, em 1814; Lavras e Pouso Alegre, em 1831; Aiuruoca em 1834; Oliveira em 1839; Três Pontas, em 1841; São João Nepomuceno, em 1841; Campo Belo em 1848; São Sebastião do Paraíso, em 1870; São Gonçalo do Sapucai e Poços de Caldas, em 1888.
Mas é a emancipação de Campanha, desmembrado de São João Del Rei que dá início ao que compreende hoje como Sul de Minas. Conforme alvará de 20 de novembro de 1789. Os núcleos principais do município foram Baependi, Jacui, Pouso Alegre, Itajubá, São Gonçalo do Sapucaí e Lavras, que no século XX vão se desmembrando em outros municípios através de leis estaduais que promovem constantes divisões administrativas. Desta forma, se desdobra em Aiuruoca, Liberdade, Pouso Alto. Jacui é dividido em Passos, São Sebastião do Paraíso e Monte Santo. Pouso Alegre, divide-se em Caldas, Cabo Verde, Alfenas, Poços de Caldas e Monsenhor Paulo. Lavras divide seu território nos municípios de Três Pontas, Perdões, Nepomuceno, Itumirim, Ribeirão Vermelho e Ijaci.

Economia
O que caracteriza a economia desenvolvida na região é a policultura, a diversificação da produção adotada na época colonial e mantida no período monárquico. Um estudo do final do século XIX revela essa antiga tendência da agropecuária do Sul de Minas: "Os terrenos a leste da Mantiqueira, ao começar pelo Mar de Espanha até o registro da Bocaina da Aiuruoca, produzem com abundância café, cana de açúcar e arroz Os terrenos que partem do Rio Grande até os altos da Mantiqueira ao Sul, abundam em milho, feijão Trigo e batata inglesa aclimatam-se bem em Aiuruoca e Baependi. O chá da Índia aclimata-se bem em Jaguari, Pouso Alegre e em todo o Vale do Sapucaí até Jacui. Algodão e cana de açúcar são produzidos em grande quantidade em todas a vertentes do Rio Grande, mas nenhum agricultor deixa de plantar milho, arroz, feijão e mandioca" (MASSENA, J. F. S. 1904; 791)
Os políticos da região tiveram expressiva participação na "política dos governadores" durante a República Velha, especialmente na chamada "política do café com leite", o mais notável desdobramento da política dos governadores. Do lado paulista tinha a intenção de privilegiar a monocultura do café e do lado mineiro tendia para a diversificação. Francisco Sales, que era de Lavras, instalou uma propriedade no município de Matozinhos, próximo a Belo Horizonte, onde mantinha uma fazenda mista no estilo da Normandia. Justifica com consciência os benefícios: "A primeira vantagem da fazenda mista está no estrume gratuito para adubar as plantações. Vem em seguida a possibilidade de rotação de pastos e a produção in loco do alimento do gado que faz baixar o custo do leite, da manteiga, do toucinho, dos capados e novilhos de corte; avoluma o lucro na venda dos animais e dos produtos da pecuária. A diversidade das produções assegura, sem dúvida, o equilíbrio econômico da empresa: quando uns produtos estão em baixa de cotação, outros estão em alta". (CARVALHO, D. 1963; 71)
Penetrando fundo no território mineiro, vamos ter o Sul de Minas sem ligações muito fortes com a parte extrema da Zona Metalúrgica, sobretudo a partir do ponto em que o Rio Grande, como acidente geográfico importante, as vai separar. Sua maior relação de identidade é com a região limítrofe do Estado do Rio, e pelo território paulista se expande em termos da civilização tradicional do Vale do Paraíba. Notando-se que a zona sul tem grande profundidade, vamos encontrar uma parte da características intermediárias entre o extremo sul, com influência acentuada, e a Zona do Oeste. Também em razão mesmo desta profundidade, os pontos centrais de irradiação interna da zona sul tem importância, assim como vão criando outras áreas de ligação. E como já ai nos encontramos em região mais profunda do próprio território brasileiro, agora uma economia interiorana, de cores cada vez mais acentuadas, se vai definindo. Ora a força de irradiação econômica vem do produto, como o café, o leite, as frutas decorrentes do clima; ora da principal atividade, como as estâncias hidrominerais; ora se prende ao sentido de irradiação comercial mais acentuado.À proporção que se vai avançando no sentido do Sudoeste, as influências do Rio Grande vão substituindo as do Sapucai que havia penetrado em profundidade a região e que deixara Varginha em ponto de especial destaque. E a reentrância do território mineiro acentua influências paulistas, porém muito diferentes das que se faziam sentir a Leste. Aos poucos se vai percebendo que se a influência paulista, nesta última, era de importância, já agora a mineirização mais acentuada da zona paulista se faz sentir nos costumes, assim como nas atividades predominantes, mesmo porque uma corrente migratória do mineiro aí se registra.(ALBINO, W. 1956)
O governo Israel Pinheiro (1966/1971) empreendeu uma política de planejamento econômico capitaneada pelo Conselho Mineiro de Desenvolvimento que era uma verdadeiro centro de inteligência de estratégia. Diversas instituições harmonicamente passaram a dar apoio ao planejamento da industrialização de Minas: O Banco de Desenvolvimento Econômico, o Escritório de Racionalização e Modernização Administrativa, Companhia de Distrito Industrial. O ponto de referência era um estudo conhecido como Diagnóstico da Economia Mineira. A região Sul de Minas, por sua posição intermediária entre a região Central do Estado e São Paulo, transformou-se em região estratégica para a localização industrial. A existência de cidades de porte médio, boa infra-estrutura e alguns recursos naturais contribuíram para tal localização. Com o incentivo fiscal a cidade de Extrema foi transformada em distrito industrial. No período de 1970/1977 foram aprovados 48 projetos de instalação de novas industrias na região, com relativa diversificação produtiva, distribuídas em 21 municípios, predominando Itajubá, Poços de Caldas, Varginha, Três Corações e Extrema. (DINIZ, C.C. 1981; 200)

Política
Em 1842 os liberais ganharam as eleições sendo as bancadas de Minas e de São Paulo as mais expressivas. O chamado Movimento Liberal foi reação dessas duas províncias contra a manobra do Conselho de Ministros que persuadiu o príncipe regente D.Pedro II a dissolver a Câmara dos Deputados, as assembléias legislativas e as câmaras municipais. Em Minas o movimento teve início no Campo das Vertentes, isto é, Barbacena, Conselheiro Lafaiete e São João Del Rei. Daí para as demais regiões da província, em que o Sul de Minas deu uma resposta muito rápida e muito forte. As tropas de Caxias entraram na Zona da Mata Mineira, na passagem do Rio Preto onde até hoje existe um marco deixado pelo comandante. Depois de assistir missa na igreja do Rosário em Rio Preto, partiu em direção à região central da província onde iam se concentrando as tropas rebeldes. No Sul de Minas encontravam-se diversas forças do lado governista, mas as forças rebeldes trataram de desmantela-las. Mensageiros e tropas marcharam para Aiuruoca, Baependi, Bom Jardim e Lavras e dissolveram a coluna governista do Rio do Peixe, próxima à passagem do Rio Preto. Em seguida essas tropas cercaram a cidade de Baependi e obrigaram os legalistas a reconhecerem a autoridade do presidente interino. Após a dispersão dos governistas reuniram-se em Lavras alguns lideres rebeldes na Câmara municipal e enviaram ofício ao governo rebelde hipotecando apoio. Disseram que não podiam faltar com a proteção à Província de Minas que mais uma vez salvava a Liberdade do País. (MARINHO, J. A.1977; 103) Os revoltosos eram homens abastados: grandes comerciantes, fazendeiros, coronéis da Guarda Nacional descontentes com as reformas chamadas leis do retrocesso impostas pelo gabinete conservador do Governo Central. Alguns deles acabaram participando do movimento republicano ou prepararam seus descendentes para efetiva participação na vida política da República Velha.
Depois da região compreendida pelas cidades de Serro e Diamantina, o Sul de Minas foi a região em que o Movimento Republicano foi mais forte. Uma das razões era a crescente urbanização e abastança econômica. O período imperial centralizava os recursos em privilégios no Rio de Janeiro. As províncias mais populosas e ricas como Minas e São Paulo, não tinham expressão de poder. Em plena campanha republicana Silviano Brandão expressa clima político do Sul de Minas em discurso pronunciado na Câmara dos Deputados a 10 de junho de 1884, em que denuncia o descaso das autoridades do Império com relação ao Sul de Minas. Durante todo o discurso os deputados republicanos como Joaquim Felício dos Santos e Pereira Cabral manifestava apoio com palavras e aplausos enquanto o conservador Olímpio Valadão bradava protestos verbais. Silviano Brandão encontrava na causa do separatismo sul-mineiro a falta de benfeitorias públicas especialmente estrada de ferro para transportar os produtos do Sul de Minas. Em seguida faz severas críticas ao curso que tomou a Estrada de Ferro do Rio Verde em face da distância que ficava dos municípios maiores produtores de café, além do custo excessivo de sua construção: "Devo enunciar-me com a máxima franqueza que a concessão da estrada de ferro do Rio Verde, nas condições em que se fez, foi o maior desserviço que se podia fazer ao Sul de Minas". (...) "Já não falo no abuso inqualificável que, segundo consta-me mandaram vir da Europa dormentes que tiveram transporte gratuito no Brasil, para uma província rica em madeira como Minas, mas que por certo não se favoreceu às empresas nacionais. Apesar de seu enorme custo a estrada é mal construída e demandará constantes reparos". (...) "O traçado dessa estrada é desgraçado. Deixa os centros populosos e as fontes medicinais e passa por lugares despovoados e de pouca produção no Sul de Minas. Hei de protestar". (LIMA, M. 1922; 384)
Um dos políticos mais expressivos do Brasil que se filiara à campanha, foi o sul-mineiro Delfim Moreira. Antes de ingressar-se na Faculdade de Direito, ainda no Curso Preparatório do Colégio Joaquim Carlos, já militava no jornalismo. Fundou juntamente com Antonio Carlos Ribeiro de Andrade, Venceslau Brás Pereira Gomes e Estevão Lobo Leite Pereira, o Clube Republicano Acadêmico Mineiro e o jornal do mesmo clube intitulado "República Mineira", em São Gonçalo do Sapucaí. (GÓE S MONEIRO, N. 1994; 588) São Gonçalo do Sapucaí era uma cidade bastante agitada. Lá viveu o inflamado propagandista da República, Lúcio de Mendonça. De Campanha dirigia o jornal "O Colombo" cujos artigos eram reproduzidos em São Paulo e Rio de Janeiro.
. Os governantes de Minas Gerais das duas primeiras décadas do século XX são originários do Sul de Minas, grande produtora de café. Com a inquietação ali e rumores de separação, Afonso Pena convidou Silviano Brandão para a pasta do Interior e Justiça e com o cargo a tarefa de organizar politicamente o Estado. Com a morte de João Pinheiro em 26 de outubro de 1908, assumia a presidência do Estado, o sul-mineiro Júlio Bueno Brandão (1858/1931) parente próximo de Silviano Brandão. Nesse mandato exerceu o cargo com eficiência, assegurando um clima de confiança e harmonia entre os políticos; dando continuidade ao programa modernizador de João Pinheiro; auxiliando a sucessão com a vitória de Venceslau Braz Pereira Gomes. (1868/1996), nascido em Brasópolis. Homem de tribuna parlamentar, acostumado à liderança e ao debate parlamentar. Enfrentou lideres como Rui Barbosa e Pinheiro Machado. No governo de Minas (1909/1912) atacou o analfabetismo por considera-lo o maior obstáculo ao desenvolvimento. Como homem sul-mineiro integrado na linha de João Pinheiro e Francisco Salles, compreendeu a importância da agricultura e que as cooperativas remediavam a evasão de mão-de-obra e de rendas de Minas na área do café. Sem o consórcio com Wenceslau Brás, Hermes da Fonseca não teria sido eleito, pois Rui Barbosa teria tido uma frente de votos maior que teve em Minas. O mais importante de Wenceslau foi garantir a Hermes da Fonseca a governabilidade. Volta ao governo do Estado Júlio Bueno Brandão, de 1910 a 1914. No segundo mandato contou com a colaboração de Delfim Moreira na Secretaria do Interior, a pasta mais importante, pois administrava parte do Judiciário, Educação, Saúde e Imigração. Como secretário do Interior preparou a reforma da divisão administrativa de Minas da qual resultou a criação de 40 municípios e de numerosos distritos. Delfim Moreira, com mentalidade industrialista entrava em conflito com o fazendeiro tradicional, pouco sensível a mudanças; incapazes de assimilar o sistema de mão-de-obra remunerada: persistência de baixo nível tecnológico quer na atividade agrícola, quer na atividade industrial. Por isso as alianças da Região Central, de tendência industrialista com o Sul de Minas, agro-exportador eram mais coerentes, porque visava neutralizar o conservantismo das demais regiões. Mas ficou conhecido na história de Minas o esforço que Francisco Sales fez para dissimular sua conivência com o interesse dos coronéis. Os "cascas-grossas" e nada escrupulosos na gestão do dinheiro público.



BIBLIOGRAFIA

ALBINO, Washington. Perspectivas atuais da economia mineira. In: Segundo seminário de estudos mineiros. Belo Horizonte?: UMG, 1956.

CARRATO, José Ferreira. Igreja Iluminismo e escolas mineiras colônias. São Paulo: Nacional, 1968.


CARVALHO, Daniel de. Francisco Sales: um político de outros tempos. Rio de Janeiro: José Olympio, 1963.

COSTA, Joaquim Ribeiro. Toponímia de Minas Gerais. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1970.

DINIZ, Clélio Campolina. Estado e capital estrangeiro na industrialização mineira. Belo Horizonte: UFMG, 1981.

LIMA, Mário de. (org) Coletânea de autores mineiros. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1922.

MARINHO, José Antônio. História do movimento político de 1842. Belo Horizonte: Itatiaia: São Paulo: USP, 1977.

MASSENA, José Franklin da Silva. Panorama do Sul de Minas. Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, ano IX, 1904.


Antonio de Paiva MOURA é Mestre em História, professor da Escola Guignard UEMG e professor do UNI-BH.





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Data:
25/12/2002


Fonte:
asminasgerais.com.br