Posse
Poema de Augusto Dutra

Viajo pelos campos e fazendas surgem,
surpreendentes em sua antiga idade.
Sonho a posse do desejo, observo-as e as possuo.
Instalo-me cúmplice da solidão sofrida.
Ardentes de paixão, elas se despem aos meus olhos devassos.
Prenhas de meu gozo voltam à dormência em longas esperas gestantes.

Olho-as compadecido, saudoso da vida borbulhante,
embora escrava, que as orgulhava.
Rápido como o silêncio, vivo a eternidade efêmera da posse,
sigo as trilhas de meus sonhos,
buscando novas amantes de antiga idade.
Encontro algumas ainda conservadas,
distantes em orgulhos aristocráticos,
mesmo assim, lanço-lhes olhares indiscretos,
buscando a infidelidade das mal amadas,
incapaz de possuí-las, pois que protegidas,
com ciúmes, faço do desejo algo que as deixe palpitantes.

As abandonadas são as minhas preferidas,
por elas me detenho, e as restauro,
deixando-as fogosas e sedutoras.
Infiel, sigo as trilhas, buscando outras amantes,
nos seios das montanhas, lá nos belos horizontes.

Por fim, cansado, molhado até os ossos,
meu pensamento se separa destas damas perigosas,
aparentemente ingênuas e seduzíveis na solidão de seus campos,
sereias do mato, prontas a tragar minha liberdade cigana.
Procuro agora por aquela que me dê pousada,
banho quente, comida e vinho, e finalmente,
me introduza em sua cama íntima,
libertando-me de minhas posses sonhadas.

Agora, aqui deitado, saciado de corpo e alma,
lentamente começo a compreender,
a carga sutil que diferença, possuir e ter.
Tola ilusão do teu domínio,
sejas ou estejas, o que for,
eu te possuo e abandono,
sabendo que a tudo ignoras.