ÁREAS PROIBIDAS


    À procura do ouro e pedras preciosas, seguiam os bandeirantes, desde o primórdio da história colonial, rumo ao interior.

    Da baía da Guanabara teria saído, em abril de 1531, a primeira expedição a tocar a Mata das Minas     Gerais. Eram quatro portugueses a explorar o sertão da costa do Rio de Janeiro. Durante sessenta      dias andaram cento e quinze léguas pela terra, sessenta e cinco delas por montanhas e cinquenta por     um campo muito grande. Transposta a Serra dos Órgãos, desbravadores atravessaram o Paraíba,      pisando a terra mineira.

    De pontos diferentes outros buscaram ainda as cabeceiras do Rio São Francisco, partindo ora do norte, ora do sul. Estimulados por cartas régias, a prometerem honrarias e prêmios aos descobridores de riquezas, acompanhavam os cursos dos rios maiores e de seus afluentes. Contornaram, nas investidas, os Sertões do Leste, atual Mata Mineira e neles penetraram.

    Depois de descobertas as minas de ouro, a grande invasão do território mineiro se fez principalmente pelo antigo caminho do Rio de Janeiro e São Paulo, o chamado Caminho Geral do Sertão, que ficou denominado Caminho Velho, depois de construído o Caminho Novo.

    "De Parati a Taubaté. De Taubaté a Pindamonhangaba. De Pindamonhangaba a Guaratinguetá. De Guaratinguetá às roças de Garcia Rodrigues. Dessas rocas ao Ribeirão, com oito dias mais de sol a sol, chegava-se ao rio das Velhas."

    Caminho Velho: do Rio, iam os viajantes, por mar, até Parati, onde começava o caminho por terra, atravessando a Serra do Mar, juntando-se a terra paulista, em princípio Taubaté, e depois, em Pindamonhangaba. Fundidos os caminhos num só, seguia este para as minas, atravessando a Mantiqueira na garganta do Embaú. atravessava o Passa-Trinta (hoje, Passa Quatro). Passava, em seguida, por lugares onde, mais tarde, surgiram cidades e povoações como Itanhandu, Santana do Capivari, Consolação, Pouso Alto, Boa Vista, Baependi, Conceição do Rio Verde, Cruzília, Ingaí; seguia-se a travessia do Rio Grande e, pouco depois de passar por Ibituruna, a do Rio das Mortes, seguindo-se até o Arraial do Rio das Mortes (São João del-Rei).

    Caminho Novo: em 1711, o desbravador Garcia Rodrigues levou a cabo a incumbência de abrir o Caminho Novo. A partir do Rio de Janeiro, transpunha a Serra dos Órgãos, e vinha direto ao Paraíba e ao Paraibuna; passava por Matias Barbosa, Juiz de Fora, Antônio Moreira, Mantiqueira, Borda do Campo, Registro. Nesse ponto havia uma bifurcação: um caminho continuava para Vila Rica e o outro saía rumo a São João del-Rei. Este caminho encurtava a viagem em 15 dias, era entretanto mais deserto do que o Velho. Ficou conhecido na História como o "caminho do ouro", por onde passaram os carregamentos de ouro destinado à Coroa. A Mata teria vínculo com o Caminho Novo, recebendo os sesmeiro das minas decadentes.

    Perdeu-se a crônica de inúmeras arremetidas rumo ao Paraíba. Malogradas quase sempre, ficaram sem o merecido registro na História.   

    Com as matas de leste sucedem também que, por não darem ouro, foram rigorosamente conservadas, sendo-lhes impedido o acesso, como barreira contra os extravios, e por isso se chamavam áreas proibidas.

    "Certão para a parte de Leste denominado Areas Prohibbidas, na epoteze de servirem os ditos certões de uma barreira natural a esta Capitania para segurança de sua fraude..."

Luís da Cunha Meneses - Governador de Minas



    A POPULAÇÃO GENTÍLICA

    Expulsos pelos portugueses, por 1630, dos campos abeirados da foz do Paraíba, internaram-se dispartidos nas florestas do Estado do Rio, índios coroados, puris e croatos. Pelo Paraibuna, pelo Pomba e respectivos subafluentes, a partir dos últimos anos do século XVII e os primeiros do século XVIII, tais tribos retirantes alcançariam Sapé e as fraldas da Mantiqueira. Bem próximo do Caminho Novo, de onde sairiam depois os sertanistas e faiscadores, abririam os Sertões do Leste. Pelo Muriaé atingiriam o Carangola, espalhando-se por planícies e serras. Escondiam-se nos sítios, onde a perseguição do colonizador encontrava as barreiras naturais da floresta.

    Próximo à atual cidade de Cataguases, encontrariam os sertanistas, no século XVIII, os coroados que distribuíam-se pelas cercanias e ribeirões no vale que se estende até o atual município de Visconde do Rio Branco. Próximo ao rio Itabapuana, local habitado por nômades, hostis ao branco, e também nas vertentes do Muriaé, encontravam-se os puris. No século XVIII mantinham-se os puris nas cercanias dos Monos, no atual município de Leopoldina. Lá os encontrariam os faiscadores, retirantes das minas em decadência. Por todo o sertão do Pomba fixavam-se os croatos e coropós. Desirmanados, naqueles vales e serras do interior, adquiriram coroados, puris e croatos, na passada dos séculos variações de linguagens e maneiras, que os tornariam diversos de seus ascendentes.

    As condições de vida nas florestas, as lutas internas, com as implicações sociais e lingüísticas inerentes a tais vississitudes, fariam que reduzissem as variações entre croatos, coropós e puris. Pequenas tornaram-se então as diferenças étnicas, sociais e culturais entre eles. Viviam em estágio primitivo de organização política e social. Viviam de caça e pesca. Nada plantavam. Furavam grande parte deles a orelha e os lábios e pintavam o corpo com tinta azul. De propriedade não tinham qualquer idéia, circunstância que explica a ausência de reação ao domínio das terras pelos entrantes.



    O DEVASSAMENTO DA BACIA DO PARAÍBA

    Já na fase mineradora tem início o devassamento das chamadas Áreas Proibidas. A aventura partia do sertão, desafiando a densidade da mata e a suspeita do descaminho

    Era acesso por rios e caudais, veredas e atalhos. Romper pela matarama, desfazendo dificuldades, enfrentando perigosos animais, tudo consistia em risco. O índio era óbice àquelas investidas. às vezes, diante do sertanista, ele surgia de fito na destruição e no incêndio, matando o invasor sem piedade.

    Para povoar o território se multiplicam as concessões de sesmarias no curso do século XVIII. A decadência da mineração acabaria alterando a política metropolitana. A erário dessagrado não mais preocupava o descaminho, ficando em desuso o preceito do velho alvará de 1733, que proibiria a abertura de novas picadas para a Capitania das Minas Gerais.

    Já se tentara também dar começo à catequese naqueles sítios, no primórdio do século XVIII, com a criação, por Carta Régia de D. João V, da Freguesia de São Manuel dos Rios Pomba e Peixe, (atual Rio Pomba) subordinada ao Bispado de São Sebastião do Rio de Janeiro.

    Porém as entradas sempre partem do Caminho Novo, independentes das medidas oficiais.

    Somente em 1765 (14 de dezembro) por ordem do Governador da Capitania, D. Luís Diogo Lobo da Silva, confirmou-se a nomeação do Padre Manuel de Jesus Maria para o cargo de Diretor dos Índios da Aldeia dos Rios Pomba e Peixe.

    Os caminhos e picadas foram se multiplicando. Da Borda do Campo (Barbacena) aos diversos aldeamentos do Padre Manuel de Jesus Maria, passando pela sede, que era São Manuel do Pomba, e seguindo rumo à Capela do Espírito Santo (Guarani), as comunicações se tornavam francas.
    A presença da poaia, planta medicinal, facilitaria o comércio com os índios, tornando possível a tentativa bem sucedida da passagem do Alto Rio Doce para o Pomba.

    O Governador Luís da Cunha Meneses determinou a exploração, por não lhe parecer haver terras inúteis "pela falta de se conhecer as utilidades que se poderão tirar das mesmas". Encarregou o Sargento-Mor do Regimento dos Dragões, Pedro Afonso Galvado de S. Martinho, de examinar as Áreas Proibidas a fim de se reconhecer como se deveriam levantar barreiras eficazes à segurança dos reais interesses. Seria também por esta portaria que o Governador ordenaria ao Alferes Joaquim José da Silva Xavier, então incumbido na ronda da mata, que acompanhasse o Sargento-Mor no exame das possibilidades auríferas das terras e de sua capacidade de acomodação de gente. A ambos, sargento e alferes, cumpriam o reconhecimento de estradas e caminhos que abertos estivessem de ligação entre Minas e o Rio de Janeiro.

    Para prosseguir a obra de Jesus Maria, na região do antigo Presídio, atual Visconde do Rio Branco, ali chegou e viveu entre os coroados o Padre Francisco da Silva Campos.

    Abre-se depois, paralelamente ao rio Doce, uma variante terrestre que se destinava à condução do gado de Minas Gerais ao Espírito Santo. A estrada tem início no trecho mineiro. Da região de Vila Rica as picadas se estenderam até a cidade de Ponte Nova, às margens do rio Piranga

    Procedente de outros pontos, mas sempre do centro minerador, obliquando à direita e à esquerda, em crescido número, gente nova surgia à demanda de terra. O desencanto da faiscagem já tornava aqueles aventureiros em pretendentes de terras para a lavoura. Parindo de Guarapiranga, atual Piranga, Mariana, Itabira, vária famílias apoderaram-se de terras então devolutas, nelas estabelecendo propriedades agrícolas. Os povoados vão nascendo no processo dessa grande migração. Mercês (1784), um pequeno núcleo, às margens do rio Turvo, seria, vinte anos após a Freguesia de Santa Rita do Turvo, cidade atual de Viçosa. A gente que povoou a região procedia de Mariana e Ouro Preto.

    Em 1813 chegaria à Zona da Mata Guido Tomaz Marlière, nomeado comandante das divisões militares do rio Doce e Encarregado da Civilização e catequese dos Índios. Iniciaria, então, a obra de desbravador e catequista dos sertões da mata, instalando o seu quartel-general no lugar denominado Serra da Onça, chamando-o Guidoval.

        Das grandes famílias que povoaram a larga faixa dos Sertões do Leste, vários ramos diretos e colaterais já se haviam estabelecido às margens do Paraíba, do lado do atual Estado do Rio de Janeiro, e deles, muito provavelmente, partiram as notícias sobre o rápido desenvolvimento da cultura do café. A busca das terras férteis do lado de Minas, numa corrida que, iniciada em 1812, somente teve fim quando todas as áreas disponíveis haviam sido distribuídas.









    TROPAS E TROPEIROS

    Os tropeiros na Mata são os mesmos do Centro e do Sertão. Gente indômita a cruzar os caminhos pelo Pomba, pelo Glória, pelo Doce e o Manhuaçu. No período minerador, transportavam o ouro ao litoral, regressando com mercadorias de toda a espécie. Posteriormente, com o retorno à lavoura, interligaram-se por todo o território. Em suas caminhadas, percorriam o Centro e o Sul, o Sertão e o Leste. E apesar das ferrovias, construídas selvas a dentro, muitas regiões, até a década de quarenta do nosso século, contavam com um único transporte - a tropa.

    As bestas de cangalhas, as mulas de cargas percorriam léguas e léguas, vadeavam os rios, arranchavam nos caminhos. Palmilhando as veredas que os índios abriram em séculos de vida agreste, o tropeiro violava a mataria, travando conhecimento com os lavradores que ermavam nas solidões.

   
    No lombo das tropas, a Mata encaminha o açúcar, o fumo, o toucinho e o milho. Recebe na volta o sal de Magé. Em regresso, no arsenal, havia também armas e munições, botas e ferramentas para os homens. As sinhás encontravam veludo e seda, botinas de duraque e artigos de luxo. Ademais, havia algodão em tecido, o chá, bugigangas e mercadorias do Rio e Campos.

    As tropas eram constituídas por mus, burros sobretudo. Formavam-se por lotes, cada um composto de 12 animais, inclusive a madrinha. À frente, caminhava o burro da guia. Seguia-lhe a madrinha, a égua vistosa, carregando cincerro silencioso, cujo toque só se fazia ouvir quando nas pastagens a tropa tinha outra vez de reunir-se para a caminhada. Marchava-lhe após o burro contra a guia. Depois, em fila, os animais carregados. A tropa mantinha a hierarquia das bestas e dos homens. Por volta de 1862 estima-se que a Província tinha em torno de 150 mil animais de carga.

    Os tropeiros conheciam perfeitamente as rotinas para aproveitar, da melhor forma possível, o esforço da ramagem. Inúmeras rotas, de grande fôlego, forma por elas percorridas a passo, e várias são na Mata as aldeias nascidas das paradas para repouso.

    Descarregados os animais, juntado o feijão com torresmo e farinha, seguia-se a sobremesa de rapadura com melado e café fumegante servido em cuité. Só então as violas começavam:



        Maria, por caridade
        Não ama tropeiro, não.
        Tropeiro é homem bruto,
        Bicho sem combinação.
        Maria, escute o conselho,
        Sossega o seu coração.



    O tropeiro desempenhou na Mata um papel complexo de bandeirante, mercador, conselheiro e capitalista.











    A PAISAGEM DO SERTÃO

    "Desconfiado, porém amável, rústico, porém hospitaleiro."

    O fazendeiro seria, nos primeiros tempos, o homem das Gerais. O prolongamento da sua terra seria o Leste. Mas a condição de atraso, o sistema primitivo de comunicação tornaram-no um rústico. Montado no cavalo inseparável, vem ele pelas picadas ao arraial, contrafeito quase sempre. Seu clima, o da roça, torna-o taciturno e introvertido. De botas e esporas, perambula pela lavoura entre negros e caboclos. Reune um rol de conhecimentos práticos, aprendidos na vida, com índios e negros, com pretas e tropeiros.

    A vida na fazenda, em seus primeiros tempos, desenvolveu um sentido fortemente paternalista. Singular o tipo de regime patriarcal dominante. Enquanto vivo, o pai é o chefe incontestável do clã. Morto, sucede-lhe a matrona, a viúva, recebendo o bastão para dirigir a família e a fazenda. Autoridade moral e energia maiores, o respeito dos filhos e genros oferecido sem contestação.

    A economia fechada isolava as criaturas num círculo de usos rotineiros e quase primitivos. Apenas a reza aos domingos, no arraial mais próximo, possibilitava algum convívio de vizinhança. As diversas atividades econômicas criam relações de vizinhança a solucionar problemas comuns. Uma delas é o mutirão, que consiste num chamado de vizinhos para realizar determinados trabalhos. A atividade tanto pode ser derrubada ou roçada, quanto colheita ou qualquer obra. Não há paga qualquer, senão o compromisso moral de retribuir, quando necessário. Talvez seja o mutirão, na mata rústica do século XIX, o elemento mais importante da sociabilidade.

    O fazendeiro procede das Minas em decadência. Desce da região barroca, onde o luxo e a riqueza desapareceram nos finais do século XVIII. Sem experiência suficiente de cultivo, em busca de terras, invadiu a mata pelos vales, fixando-se em fazendas com lavouras de subsistência

    A plantação de café iria modificá-lo. Desloca-se do vale direito do Paraíba na segunda metade do século XIX. Os primeiros grupos começaram a chegar pelos afluentes. Filhos e netos de mineiros regressavam à província materna. O latifúndio exaurira o solo fluminense e avançava, tragando novas terras com negro e café.

    A gente que entra povoa os vazios, misturando o litoral com o barroco já quase delido num rústico genuíno.

    As gerações da Mata ainda guardavam tradições dos velhos pioneiros, mas se adaptam facilmente à lavoura cafeeira. Do convívio nasceria um novo tipo, na mistura de virtudes e defeitos.

    Nos finais do século XIX a estrada de ferro modificaria o fazendeiro. Num instante o litoral se aproxima, o transporte do café se facilita, seu beneficiamento se processa nas ruas próximas à estação. Toma-se o trem da Leopoldina para viagens até a Corte. O velho fazendeiro contrata a professora da cidade ou envia o filho, futuro doutor, à escola. A segunda geração ganha um verniz diferente.

    Os recurso alimentares, distribuídos ao redor da sede, consistiam principalmente em mandioca, milho e feijão. A carne era de boi e de porco, além de galinhas e animais selvagens. O trivial mineiro, numa fazenda da mata, na segunda metade do século XIX, era o feijão com angu e torresmo, lombo de porco assado, lingüiça, couve e farinha de milho. Aos domingos, a galinha, e sobremesa, doce de cidra com queijo ralado ou o melado com farinha ou mandioca. Depois do jantar, na varanda, chá de congonha ou café adoçado com rapadura. Toda a base alimentar procedia da região mineradora, sem uma direta influência indígena. Esta limitou-se a frutos silvestres e ervas, sobretudo as medicinais.
   


    A PROPRIEDADE RURAL

    A colonização portuguesa no Brasil assentaria os seus alicerces no aproveitamento agrícola das terras, fazendo uso de uma experiência de agricultura tropical, adquirida nas ilhas do Atlântico. Por meio de sesmaria procura-se ocupar o solo de forma permanente, e ela encontra no açúcar o seu destino econômico, tornando-se com o engenho a unidade produtora da colônia. Dar a sesmaria terras ribeirinhas, o mais próximo possível das vias, a pessoas com posses para estabelecer engenhos, assinalando-se-lhes para isso um certo prazo, rezaria o Regimento Interno do Governador-Geral. Toda a economia nacional será norteada no sentido de fortalecer a grande exploração rural, que asfixia a pequena propriedade.

    A propriedade rural na Mata tem as suas origens nas sesmarias. As primeiras têm início no começo do século XVIII, nas proximidades do divisor geográfico Minas-Rio, ou seja, o Paraibuna. Das cartas de 1710 a 1822 constam as concedidas a personagens históricas, todas às margens do Caminho Novo. A distribuição prossegue na segunda metade do século XVIII, na região da serra de São Geraldo (vertendo para o Turvo, afluente do Piranga, e as vertentes do Xopotó, afluente do Pomba), a partir de 1768.

    Em 1822, suspendia-se pela Resolução de 17 de julho, a concessão de sesmarias. Advém um período sem leis atinentes às terras públicas. E a tolerância enseja a pura ocupação. O invasor aprofunda-se na Mata, escolhe o sítio que lhe parece adequado à edificação da morada, prepara o roçado e torna-se o dono incontestável. Para o futuro, nasceriam dúvidas e demandas, marcando nos fastos do sertão um capítulo de violência e arbítrio.

    A Mata foi inteiramente percorrida, fixando-se os posseiros em todo o seu território. De grande importância, pois, a extinção do regime sesmarial para o seu devassamento e colonização. A sesmaria fora o latifúndio, inacessível ao lavrador sem recursos. O apossamento seria pelo contrário, ä pequena propriedade agrícola, criada pela necessidade, na ausência de providência administrativa, sobre a sorte do colono livre e vitoriosamente firmada pela ocupação.

    Na mata, pois, desde os primórdios de seu devassamento e colonização, a grande propriedade latifundiária se consolida. Os municípios formam-se graças à proteção de um fazendeiro, chefe político local e muitas vezes um futuro barão.



    CRESCIMENTO DEMOGRÁFICO E URBANIZAÇÃO

    As Áreas Proibidas tornar-se-iam em Mata, após a derrogação dos dispositivos que protegiam o erário do contrabando e descaminho.

    Cinco são as fontes de povoamento. A primeira é representada por uma gama de aventureiros, em destaque os faiscadores, à cata de ouro e diamante, seguindo-se o poiaeiro, o comprador de peles, o comerciante de gado. Em segundo lugar estão as aldeias indígenas, nelas incorporadas o catequisador, o foragido, o viajante que se torna sedentário. Segue-se o pouso dos caminheiros: desenvolvido, transfez-se em arruamento, local de escambo. Há, também, as fazendas, seja de sesmaria ou simples apossamento. Por derradeiro, os núcleos deliberadamente fundados. Em toda a Mata a reunião de lavradores vizinhos e o levantamento da capela sob a invocação de um santo piedoso. A partir da iniciativa nasce o núcleo, embrião de um povoado.









    Um dia estaca a tropa para o descanso. Do pouso transitório, surgido de interesse contingente, surge o núcleo. A estalagem improvisada permanece, após a retirada. Outros viageiros chegam, encontram gente, estanciam. A venda mostra-se, e aos domingos os lavradores reúnem-se para a reza e conversa. o compadrio completa o quadro social da aldeia nascente. A estalagem atrai o ferreiro,, consolida o negócio da venda. Arria a mochila, campeando o mascate, que ali pega do negócio definitivo, antes carecedor de andança e canseira. A rancharia começa de atrair os interesses das lavouras vizinhas. Um centro de pousada, com gente afoita e vivida. Afinal, vira rua de feira franca, movimentada e, em pouco tempo, ganha trepidação e gente nova. Estende-se o arruado, acompanhando o ribeirão. Cresce o arraial

    O êxodo das minas faz crescer os pontos esparsos. Enquanto cresciam os povoados às margens do Paraibuna, favorecidos pelo Caminho Novo, rota de êxodo das Minas em decadência, árduo no sertão do Pomba era o processo de urbanização.

    Em 1818 é erguida uma capela no povoado de Porto Novo do Cunha e, em 1832, cria-se a freguesia de São José D' Além Paraíba, tornado município em 1880 que passa a Além Paraíba em 1923.

    Ligadas à ação pacificadora de Guido Tomás Marlière, outras povoações aparecem na primeira metade do século XIX. Ele próprio fundaria a de Meia Pataca, hoje Cataguases em 1828.

    A antiga fazenda de Vau-Açu, também denominada Ponte Nova, desenvolve-se e é elevada à categoria de paróquia em 1832. Criou-se a vila em 1857, tendo emancipado em 1866.

    Em 1836 o Governo da Província encarregaria Henrique Halfeld de construir a estrada do Paraibuna, em cujas imediações formou-se o povoado de Santo Antônio do Paraibuna, que deu origem à cidade de Juiz de Fora.

    Em torno de uma capela erguida em honra a São Januário, cresce um povoado que em 1841 torna-se paróquia e em cidade de Ubá em 1857.

    Da subdivisão de uma sesmaria em 1728 surge o primeiro núcleo conhecido como Arraial de João Gomes. Em 1889, ainda durante o Império, é criado o município que recebeu o nome de Palmyra. Em 1932 a denominação é trocada para Santos Dumont.

    Em 1800, o Padre Francisco José da Silva recebeu a autorização para construir uma capela dedicada à Santa Rita. O povoamento que se desenvolveu no entorno da capela ficou conhecido como Santa Rita do Turvo. Por ato do regente Feijó, em 1832, o curato de Santa Rita do Turvo foi elevado à freguesia, e em 1871, o distrito foi elevado à vila. Cinco anos depois, a vila é elevada à categoria de cidade como Viçosa de Santa Rita.

    Por volta de 1830 aventureiros se instalaram às margens do Córrego Feijão Cru e deram início ao povoamento que recebeu o nome de São Sebastião do Feijão Cru. Em 1854, tornou-se Vila de Leopoldina, e no ano seguinte foi criado o município de Leopoldina.

    Com a chegada, entre 1860 e 1874, de colonos suíços, alemães e franceses, a região de Manhuaçu ganhou impulso para seu desenvolvimento, sendo criado, em 1877, o município de Manhuaçu.





    AS ESTRADAS

    A pioneira das modernas rodovias foi a União e Indústria, idealizada e construída por Mariano Procópio, ligando Juiz de Fora a Petrópolis e, portanto, ao Rio. A Cia. União e Indústria, fundada por Mariano Procópio, foi incorporada em 1853, com o plano grandioso de chegar até o Rio São Francisco. O trecho de Petrópolis a Juiz de Fora foi festivamente inaugurado em 1861, possuindo um total de 144 km (pouco mais de 4o em território mineiro), sendo encampada pelo governo do Império em 1864.

    Se nos primeiros decênios do século a lavoura cafeeira foi limitada pela precariedade das comunicações e transportes, com a inauguração da Estrada União e Indústria e seus ramais, a Província iria crescer acentuadamente sua produção.

    O impulso da lavoura cafeeira só se dará, no entanto, com o aparecimento das ferrovias. Seu surto, além de modificar fundamentalmente as condições de transporte, repercutiu também na economia.

    A primeira ferrovia que penetrou em território mineiro foi a E. F. D. Pedro II. Em 1o. de maio de 1869, eram assentadas os primeiros trilhos em Minas. As duas primeiras estações ferroviárias, Santa Fé e Chiador, então no município de Mar de Espanha, foram inauguradas em 1869, chegando a ferrovia em Juiz de Fora em 1875.



    A FAZENDA DE CAFÉ

    Ao aproximar-se a primeira metade do século XIX, transpondo as terras onde vertem o Paraíba, enchem-se as lavouras de cafezais.

    Apresentava a fazenda de café, em geral, um grau de capitalização inferior à usina de açúcar, em virtude da condição de equipamento utilizado. Nos grandes estabelecimentos próximos ao Paraibuna eram complexas as instalações destinadas à limpeza, secagem e beneficiamento do grão. Os proprietários dispunham de máquinas e terreiros pelo menos cobertos de tijolos . A Mata adotava, como o Sul de Minas e a região paulista, o estabelecimento de novas relações de produção, admitindo o trabalho semi-livre, a colaborar como o escravo e a cuidar da colheita do grão.

    O café proporciona às comunidades o calçamento, a luz elétrica e, finalmente, certa ordem social e política. Trazia não só a lavoura com renda superior. Em sua escalada, cresceram as comunidades, que receberam melhor organização administrativa e jurídica. Vieram os doutores para os cargos de magistratura, os bancários atraídos para a solução dos litígios. O café atraiu também os representantes do comprador, comerciantes de praças adiantadas, que montavam armazéns com máquinas de beneficiamento do grão. Provocaram o crescimento do mercado de trabalho, empregando catadeiras em serviços ligados à atividade mercantil. Além de que, sua presença democratiza o financiamento, levando o capital ao pequeno lavrador para o custeio da safra.













    CAFEICULTURA

    O desenvolvimento da cafeicultura não só será o responsável pelo povoamento e ocupação da Zona da Mata, como dele dependerá a reorganização da economia mineira.

    A maior produção de café de Minas continuava se concentrando, durante as três primeiras décadas do século XX, na Zona da Mata. Só que com uma diferença importante: principalmente após a crise de fins do século XIX e início do século XX, as maiores unidades produtoras não se localizavam mais nos vales do Paraibuna e do Rio Pomba. E a maior parte do café, na Zona da Mata passou a ser produzida nas vales do Rio Doce e afluentes, a nordeste da região.






   


    O CORONELISMO

    Na Mata, a partir da consolidação da economia cafeeira, adveio uma estrutura de liderança. Como processo, encrava as suas raízes num sistema social e político de quase meio século. Um retrospecto de seu comportamento, de meados do século passado até 1945, revela-nos que o líder, coronel ou doutor, pouco difere na média do grupo. O recrutamento não se deveu a origem necessariamente. Entretanto, na raiz das comunidades está o grande sesmeiro.



    A MATA E A REPÚBLICA VELHA

    A República em Minas seria a rubiácea. Identifica os interesses do Sul do Estado e da Mata, unindo as regiões nas artimanhas políticas. Desde os princípios da República, o poder se caracterizava por uma base municipalista. Silviano Brandão, secretário do Interior de Afonso Pena, seria a grande liderança da Mata, participando com desembaraço nos conchavos da sucessão estadual e em todos os embates políticos. Assumiu o governo de Minas em época particularmente difícil, período que ficaria na história como encilhamento. A Mata voltaria ao poder num contexto mais amplo. A cunha introduzida na cúpula do Partido Republicano Mineiro consolida-se no primeiro lustro do século: Raul Soares, filho de Ubá, e Artur Bernardes, natural de Viçosa, assumem ambos a chefia da política da Mata. Artur Bernardes será o Presidente do Estado. Em 1918 elegia-se Bernardes presidente da República, fixando na História a imagem do político da Mata.

















    A PAISAGEM SOCIAL

    No meado do oitocentos ganha nítido contorno a paisagem social. As aldeias viraram cidades, crescidas com casario e jardins. O café fortaleceu a lavoura, e o trem facilitaria o contato com o progresso litorâneo. Chega a informação pelo telégrafo e correio, atualizando a gente interessada nas coisas.

    A cidade conquista o calçamento. Pés-de-moleque cobriram-lhe as ruas estreitas. Aprimoram-se as construções; resiste a poeira o caiado das casas. Os fios de iluminação elétrica elevaram-se, dispuseram-se, ante a surpresa dos matutos, e a linha férrea estendeu-se por diferentes caminhos. A folha da capital, diária, trazia as novas. Aparece a imprensa.

    Agrupam-se os habitantes em classes. Na camada superior estão os fazendeiros, os doutores, os compradores de café, os funcionários públicos, o farmacêutico. Constituem a elite, interligam-se em relações sociais e familiares. Na segunda camada vêm os proprietários menores. Na mesma categoria se acham os caixeiros e os pequenos comerciantes. Por fim, a ralé, constituída de assalariados, gente sem recursos, pobres de toda a espécie, operários e domésticas.

    Excetuando o trabalhador rural, andrajoso e descalço, as pessoas se vestem do mesmo modo. Até a década de vinte os moradores de condição superior trajavam fraque, principalmente os doutores. De vinte em diante o linho inglês substituiu o rigor antigo.

    Em muitas cidades o horário de recolhimento fixava-se pela chegada do expresso da Leopoldina. O trem trazia os jornais e punha fim à jornada. Inúmeros hábitos fortalecem a sociabilidade. Ao redor do banco de jardim, no bar, na barbearia e na farmácia, reúnem-se, anos a fio, em palestras infindáveis, os figurões da cidade. Os sinos da Ave-Maria, repicados na igreja, ensejavam o passeio dos adolescentes, enquanto nos jardins as crianças corriam em disputas. Por via de regra, a mineira da Mata era discreta e prudente. A vida na cidade era aliviada, tal como na fazenda por uma fácil e vasta criadagem. Mais tarde, o cinematógrafo provocou assombro no meio rural.

    Mal crescera a comunidade, apareceu o bacharel. muitas vezes é filho da região, de fazendeiro. Monta banca, casa-se na terra, entra resoluto na política. Tal prestígio do bacharel é conjuntural, pois a sociedade de fazendeiros e a incipiente burguesia urbana exigiam, no restrito campo de suas necessidades, o legista para a solução dos atritos e dos crimes adstritos à paisagem social.. O médico ora o segue, ora o precede, no arraial. Enfrenta o curandeiro, poderoso da Mata, misterioso e temido, respeitado pelo adulto.

    Na textura da Mata, porém, impera a violência. Na fazenda, curvado em seu canto, o jagunço aguarda o aceno do senhor para a empreitada oportuna. Geralmente ele agride de surpresa, convocando o homem adequado e dando-lhe as instruções terminantes. A arma, a garrucha, já pronta se acha desde os tempos do sertão. Na tocaia, por dias, o cabra espreita o caminho, escolhendo para o crime as noites de lua. Foge, em seguida. Retorna à fazenda, ao sossego, picando o fumo, na manhã seguinte, para o cigarro de palha.
   






   

   




    INDUSTRIALIZAÇÃO DE JUIZ DE FORA 1850 - 1930

    JUIZ DE FORA

    Juiz de Fora surgiu como um pequeno arraial que se formou com o novo traçado introduzido no então "Caminho Novo". O engenheiro Henrique Guilherme Fernando Halfeld, em virtude de um contrato de 13 de maio de 1937, com o governador de Minas, para a abertura de um caminho entre Ouro Preto e o Rio Paraibuna, planejara e construíra a obra que se denominaria Estrada do Paraibuna". O novo traçado da rodovia, concluído em 1838, transformar-se-ia, no lugarejo a que dera origem, em Rua Principal, depois Rua Direita e, hoje, Avenida Rio Branco.

    O lugarejo de Santo Antônio da Paraibuna, como então se denominou, não passava, em 1838, datas de sua fundação, de um arraial com reduzido número de habitantes. De um pequeno aglomerado de casas que serviam de sede de fazenda e de pousada para os tropeiros.

    Em 1850 criava-se a paróquia de Santo Antônio de Paraibuna e o povoado, em virtude de lei, desmembra-se do município de Barbacena e ascendia à categoria de Vila.. Sua população era estimada em 500 habitantes.

    A instalação oficial do município dá-se em 7 de abril de 1853, o que deve ter estimulado positivamente o espírito pioneiro e criador dos primeiros habitantes. Isto se traduz na intensificação do comércio, na dinamização das construções urbanas, atração de novos habitantes, aumentando e diversificando sua população.

    Em 1856, ocasião em que a vila foi transformada em cidade do Sano Antônio do Paraibuna (Lei 759, de 2 de maio do mesmo ano) a população urbana ainda era diminuta: contava mais ou menos com 600 habitantes.

    O estabelecimento da sede da Cia. União e Indústria, a introdução dos imigrantes e a criação da Colônia D. Pedro II vão ser um forte estimulo ao crescimento urbano. Com a inauguração da Rodovia União e Indústria, em 1861, Juiz de Fora se transformou no entreposto comercial por excelência da Zona da Mata. Com isto intensificam-se os processos de divisão social do trabalho e de troca de mercadorias, tendo como resultado a diversificação da economia e a inauguração de uma nova fase de crescimento urbano acelerado, assim como maior concentração de capital.

    A maior parte dos produtos exportados e importados por Minas Gerais (centro, oeste, partes do sul e da Zona da Mata) tinha que, obrigatoriamente, passar por Juiz de Fora por uma razão muito simples: utilização de um sistema rápido e eficiente de transporte. Isto permitiu o desenvolvimento do comércio de importação e exportação, de atacado e varejo. Para o produtor e o consumidor, tornava-se mais barato e mais cômodo venderem sua produção em Juiz de Fora e ali mesmo abastecerem dos produtos de que precisasse sem necessariamente recorrer ao Rio de Janeiro.

    Por ser terminal da Rodovia que servia a uma importante região cafeeira e ter-se transformado em pólo econômico mais dinâmico da Zona da Mata, Juiz de Fora começou a aglutinar grandes interesses, tornando-se palco de grandes negócios, de intensa circulação de mercadorias, de grande concentração e acumulação de capital.






    Entre os imigrantes chegados no dia 7 de janeiro de 1856, incluía-se um leque variado de especialistas: mecânicos, ferreiros e técnicos em construção de pontes. A fixação dos imigrantes na cidade, concluído o prazo dos contratos, organizando pequenas indústrias (cervejarias, oficinas de carroças, máquinas agrícolas e de reparos), serrarias, curtumes, fábricas de implementos agrícolas, casas de comércio ou dedicando-se ao setor de serviços, significou, por um lado, a existência de um mercado consumidor para o qual destinavam produtos de suas especializações e, por outro, mediante sua incorporação como produtores, a ampliação e diversificação do mercado consumidor local. A introdução dos imigrantes foi responsável pela formação do mercado de trabalho especializado que posteriormente engrossado pela vinda de novos imigrantes e de outros trabalhadores não qualificados, possibilitou, mediante seu trabalho criador o desenvolvimento industrial de Juiz de Fora.

    Em 1875, foi inaugurada a Ferrovia D. Pedro II. Em 1878, funcionavam seis estabelecimentos de ensino. Em 1881, inaugurou-se o serviço de transporte urbano de passageiros e de cargas (bondes de tração animal); em 1983, o telefone urbano e, em 84, o telégrafo. A partir de 1885, a população urbana começou a ser servida de água a domicílio. Em 1887, fundou-se o primeiro banco: Banco Territorial e Mercantil de Minas Gerais e a Sociedade Promotora da Imigração. Em 1989, criou-se um novo banco - o Banco de Crédito Real de Minas Gerais -, e inauguraram-se os serviços de iluminação elétrica da cidade. O Censo Federal de 1890 acusou uma população de 17.622 habitantes para o distrito

    Podem-se distinguir dois períodos no processo de industrialização em Juiz de Fora até 1930. O primeiro refere-se à implantação, e o segundo, ao desdobramento do processo. O primeiro se caracteriza pelo predomínio de pequenas fábricas, pequenas oficinas, com baixa produção e produtividade, utilizando uma tecnologia elementar, como baixo índice de capital investido, absorvendo pequena quantidade de mão-de-obra, O proprietário do estabelecimento é também o produtor direto, e a produção vai depender basicamente da habilidade dos artífices. Esta fase estende-se até o fim da década de 1980.

    Delineia-se o segundo período a partir do início do século XX, quando, ao lado das pequenas indústrias que se mantêm e de outras que haveriam de se organizar, iniciam-se a fundação e a criação de médias e grandes indústrias locais, com produção em série, grande contigente de operários, além de utilização de tecnologia importada. Data deste período a criação de escolas secundarias e, posteriormente, das escolas superiores destinadas à formação de mão-de-obra, a geração de energia elétrica com a Cia Mineira de Eletricidade (1889) e a sua posterior aplicação como força-motriz à indústria (1898).

    Empresas fundadas por imigrantes: 1860, o colono Herr Kunz instalava a primeira cervejaria da Província de Minas, na colônia São Pedro, utilizando como matéria-prima milho ao invés de cevada. Em 1861, o ex-colono e metalúrgico Pedro Schubert foi, segundo Stheling, o primeiro a fundir ferro-gusa em Juiz de Fora, utilizando-se de um forno catalão. Posteriormente, associado com o ferreiro Hass, transformava a firma Schubert, Irmãos e Hass, anexando-lhe uma serraria movida a vapor e especializando-se na fundição de ferro e bronze, e na fabricação de máquinas agrícolas. Os imigrantes Felipe H. Georg (ex-colono), Pedro Scoralick e José e Miguel Mauler dedicaram-se ao ramo de construção e pintura de residências. Jacob Kneip e Francisco Salzer Montam oficinas de materiais de construção. Henrique Surerus e Irmãos, chegados com outros familiares em 1861, iniciaram suas atividades no ramo de construção e, mais tarde, em 1886, estabelecem-se no centro da cidade com artigos de construção, oficina, serraria e fábrica de carroças. Em 1885, o ferreiro Martin Kasher fundava uma oficina mecânica dotada de tecnologia para fundição de ferro e uma serraria movida a vapor. Fabricava carroças e ferro de engomar a carvão. Por esta época, o seleiro Weitzel estabelecia-se no Largo do Riachuelo, fabricando produtos de sua especialidade. Em 1867, surgia a segunda indústria de cerveja - a Cervejaria Kremer - montada pela sua congênere Augusto Kremer e Cia de Petrópolis. Em 1874, o artífice Luiz Scheiss inaugurava uma nova oficina. A terceira cervejaria da cidade, localizada na Vilagem, foi organizada por José Weiss no ano de 1878. Peter Biesse desenvolveu indústria de couros (1885). Em 1878, Correa e Correa: fábrica de calçados e móveis.. !880, nova cervejaria - a Fábrica Borboleta, sendo proprietário os irmãos Scoralick. No ano seguinte outra cervejaria - a Fábrica do Poço rico. Carlos Augusto Degwert, outro imigrante estabelecia-se com uma nova oficina - a Chave de Ouro. Em 1886: a Fábrica Winter (cervejaria e uma oficina de Henrique Surerus.



    Foi fundamental nas duas fases de processo de industrialização de Juiz de Fora a participação dos empresários autóctones, quer locais, quer vindos de outros municípios. Mais de 50% dos empreendimentos industriais fundados entre 1889 a 1930 são resultados de suas iniciativas. Bernardo Macarenhas consegue trazer, em carros de bois, os primeiros teares para Minas. Em 1887, volta-se para Juiz de Fora participando de diversos empreendimentos, montando, em 1888, a Tecelagem Bernardo Guimarães, fundando também a Cia Mineira de Eletricidade. A inauguração da luz elétrica foi feita aos 5 de setembro de 1889. Devido à pressa para a entrega da obra, a barragem do rio fora construída de madeira, e a montagem da usina de transmissão, pelo próprio Bernardo. A 28 de agosto de 1898, inaugurava-se, pela primeira vez no Brasil, a instalação de dois motores elétricos aplicados à produção industrial.

    O grupo Assis-Penido, proprietário de diversas fazendas, adquiriu, em 1911, o controle acionário da Cia Mineira de Eletricidade das mãos da família Mascarenhas. Em 1909, era criada a Cia de Laticínios de Juiz de Fora. No setor industrial temos, entre outras, a fundação, em 1914, da Cia Fiação e Tecelagem Santa Cruz e da Cia Fabril de Juiz de Fora..

    Estabelecido em Juiz de Fora desde 1882 com a casa comercial - A Barateza -, Francisco Batista de Oliveira, foi o idealizador e principal fundador da Academia de Comércio, cujo objetivo era formar negociantes e administradores. O empresário Morais Sarmento também se transferira para Juiz de Fora, fundando em 1909 a Fábrica de Fiação e Tecelagem Morais Sarmento.

    Finalmente, cumpre assinalar, a participação de capitais ingleses no processo de industrialização. Em 1883, um consórcio de firmas inglesas, Morris e Cia, Steele e Cia e Harry, adquiriu da decadente Cia União e Indústria uma vasta área onde estavam situadas as oficinas e instalam a Cia de Fiação e Tecelagem Industrial Mineira, popularmente conhecida com a fábrica dos ingleses.

    O proletariado de Juiz de Fora, a exemplo do proletariado brasileiro dos começos do século, por sua própria condição de classe, enfrentava condições de vida que, pelos relatos da época, mal lhe permitiam sobreviver. Segundo a União Operária, em 1913:

        ä situação do proletariado nesta cidade é nada
lisonjeira, os salários são mais do que exíguos
e o horário oscila entre 9 e 10 horas de
trabalho por dia, percebendo os trabalhadores
2$, 3$, 5$ e, raras vezes, 6$ por dia, que não
    chega para cobrir as suas necessidades,
queremos dizer as suas despesas mais
necessárias..."

    Em 1906, já existia uma organização de operários em Juiz de Fora cuja denominação dá conta de sua finalidade e orientação - Centro Beneficente das Classes Operárias. A Liga Operária de Resistência do Povo Trabalhador é instalada em 1o. de maio de 1907. A conquista da jornada de 8 horas está entre as principais reivindicações da luta que a classe operária levou pela regulamentação do trabalho durante a primeira República.



    A greve de agosto de 1912, em Juiz de Fora, se insere no movimento da classe operária brasileira pela redução do horário de trabalho. Em atitude pacífica, numerosos operários percorrem as ruas principais da cidade, erguendo vivas ao proletariado, ao presidente de Minas e ao presidente da Câmara Municipal. Param em frente às fábricas, pedindo a adesão dos companheiros.

    O Farol: "quase nenhuma fábrica trabalhou, permanecendo os grevistas em seu posto e não cedendo em nenhuma de suas reclamações".


    Em 2 de janeiro de 1920 é declarada a greve geral do operariado de Juiz de Fora. Um panfleto da Secretaria da Associação Beneficente Operária de Juiz de Fora circula:

        "Um horário que começa às 5 e meia da manhã e vai
até às 9 horas da noite, e uma tabela de salários que
nunca nenhum inglês se lembrou de propor no seu
país..."

    No dia 10 de junho de 1924 as operárias da fábrica de tecidos Bernado Mascarenhas iniciam greve por aumento de salário, há muito pleiteado, intimando seus companheiros de trabalho a acompanharem-nas. A polícia toma medidas preventivas. O movimento generaliza-se por toda a cidade constituindo-se num dos poucos exemplos de luta de classe à época no Brasil.

    Segundo Antonio Lima Bandeira, em sua tese de mestrado Análise dos efeitos da política de erradicação de cafeeiros, Caratinga e Manhuaçu, a Zona da Mata passou a exercer importante papel na economia mineira, principalmente como supridora de bens agrícolas para consumo da população vinculada à economia aurífera.

    Com a introdução da atividade pecuária, o processo de ocupação se intensificou mais ainda para se consolidar, posteriormente, com a fixação das lavouras cafeeiras que, do Vale do Paraíba, demandavam o interior mineiro, já por volta de 1830, porém consolidade por volta de 1880.

    A partir dessa época começou a Zona da Mata a desempenhar destacado papel que lhe estava reservado na economia do Estado. Por muito tempo a região manteve sua hegeomonia econômica estritamente relacionada com sua privilegiada localização geográfica.

    Entretanto, sua principal atividade, a cultura do café, entra em lenta crise. À medida que os solos iam esgotando, novas áreas da mata eram derrubadas e postas em cultivo mais para cima, na encosta dos morros. A erosão acelerada, favorecida pelo plantio das fileiras de café segundo as linhas de maior declive, provocaram um esgotamento rápido dos solos. Por tudo isso, o café dura, nesta região, de 20 a 30 anos.

    Por outro lado, enquanto no planalto paulista as relações de produção na cultura do café evoluiram num sentido capitalista, com o regime de colunato, na Zona da Mata eles regrediram, num sentido semifeudal.

    A esta lavoura em decadência, a Zona da Mata teve seus problemas de renda e emprego agravadas pela erradicação de cafezais na década de 1960 e pelo fato de não ter conseguido desenvolver atividades substitutas que pudessem empregar a mão-de-obra liberada pela cafeicultura. O setor industrial está sobretudo voltado para indústrias tradicionais como a de alimentos, texteis e de madeiras, mas o setor agrícola continua a ser a principal atividade do quadro econômico regional, em que pese a forte concentração da propriedade agrícola e o uso das terras pouco difersificado, concentrando a produção em arroz, milho, feijão, fumo, cana de açúcar, café e pasto.